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publicado dia 1 de dezembro de 2016

Garantir participação social real é fundamental para Cidades Educadoras

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Entre os 17 objetivos escolhidos pela Organização das Nações Unidas(ONU) para “transformar nosso mundo”, divulgados no final de 2015 como parte da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, está a participação social e a garantia de que as tomadas de decisão – em todos os níveis – sejam responsivas, inclusivas, participativas e representativas.

Como tornar efetiva a participação social é uma questão complexa e que foge de respostas óbvias. Mesmo com a consolidação de instâncias participativas no Brasil, com a criação de conselhos, conferências, ouvidorias públicas e órgãos nos quais a presença da sociedade civil é uma prerrogativa, ainda existe uma enorme distância entre os processos decisórios e o cidadão comum.

“A participação é um grande gargalo na nossa sociedade”, reflete Lia Salomão, coordenadora do programa Carta da Terra em Ação, da Umapaz (Universidade Aberta de Meio Ambiente e Cultura de Paz). Para Raiana Ribeiro, gestora do Programa Cidades Educadoras, da Associação Cidade Escola Aprendiz, ampliar e consolidar ações de escuta e participação nos territórios é um desafio. “Não vamos conseguir transformar a cidade se tivermos ações isoladas e ensimesmadas. É preciso que essas ações conversem entre si e tenham por fim um mesmo objetivo.”

Participação e democracia

Na opinião de Maurício Piragino, diretor da Escola de Governo, a participação política dá um norte para o aprofundamento da democracia. “No Brasil, confundimos a ideia de cidadão com a de consumidor. Existe uma diferença grande, porém: o consumidor vive em um espectro do individualismo, enquanto o cidadão está no âmbito do coletivo. E a ação e participação política é sempre coletiva”, observa.

Encontro Regional da Rede Cerrado contou com a participação de autoridades do governo e ONGs. (Davi / Casa das Redes)

Piragino definiu como exemplar a mobilização da comunidade caiçara de Caraíva, no litoral baiano, quando chegou a energia elétrica no local. Descontente com o impacto dos postes e fios elétricos na paisagem paradisíaca, o povo se uniu para pressionar o poder público a enterrá-los. E conseguiu.

“Vivemos tempos bicudos no Brasil, de processos arbitrários”, relembra Piragino. Ele citou dois casos para ilustrar sua afirmação: a invasão do Condepe (Conselho Estadual de Direitos Humanos) pela polícia e a abrupta interrupção de um espetáculo teatral sobre violência policial em Santos, também pelas forças de segurança pública.

A mudança de mentalidade é um dos principais obstáculos para que as instâncias de participação sejam transformadas. “As pessoas estão muito presas às suas ideias pré-moldadas. Mas é através dos pequenos atos que cada um pode articular que daremos um novo rumo à história. É na ação cotidiana, coletiva e política de pequenos grupos que encontraremos a saída.”

Descolamento

Conselheiro da Agenda Pública, Bruno Gomes aponta para o enfraquecimento das estruturas institucionais de participação social a partir de um “descolamento proposital”, baseado na desconfiança da população sobre o papel do Estado. “Essa desconfiança permeia as instituições públicas e também atinge os órgãos de participação. Em um momento como o atual, de crise de representatividade, os espaços de participação direta são em sua maioria ocupados por profissionais da política e da militância”, observa. “Não se reconhecer ali faz o cidadão comum não participar.”

Retomando a ideia de Piragino, Gomes também acredita que a ética mercadológica sobrepõe o espírito público na maioria dos cidadãos. “Ele não se enxerga como coautor de políticas públicas, mas sim consumidor, exigindo que o Estado produza boas políticas e de acordo com o seu interesse.”

Para ele, torna-se fundamental ultrapassar a individualidade e atingir uma construção coletiva daquilo que é público. “Acredito que, mais que ideias e discursos, a participação social deve ser vista como uma experiência sensorial. É preciso pensar a entrada e o engajamento da sociedade com a política a partir de movimentações espontâneas e participações, experiências essencialmente coletivas.”

Como tornar efetiva a participação social é uma questão complexa. Ainda existe enorme distância entre os processos decisórios e o cidadão comum no Brasil.

Nessa perspectiva, a Cidade Educadora pode ser um interessante caminho para se aprofundar a democracia participativa. “A ocupação do espaço público deve ser vista como o grande impulsionador de mais participação social. Criar o hábito do encontro e o espaço para a experiência coletiva talvez seja tão importante quanto formar e educar as pessoas”, defende Gomes.

O debate sobre participação social aconteceu durante o IV Seminário Educação Ambiental Semeando a Cidade Educadora, que ocorreu na quarta-feira (23/10) na Umapaz.

CADES

Uma das integrantes do Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável(CADES) e mestre em Políticas Públicas pela Universidade Federal do ABC (UFABC), Tatiana Montório aponta a dificuldade de disputar espaço “com a galera do capital” na instância participativa.

Ela aponta diversas fragilidades do órgão, que tem caráter consultivo e deliberativo em questões referentes à preservação, conservação, defesa, recuperação e melhoria no meio ambiente natural.

“Primeiro: falta transparência ao processo eleitoral. Segundo: se olham para os integrantes como se fossem todos iguais, mas são todos diferentes. Terceiro: existe uma dificuldade enorme de entender a estrutura do conselho por parte da sociedade civil”, elenca Tatiana, enfatizando a dificuldade de dialogar com outras instâncias públicas que prezam pelo meio ambiente, como a Secretaria do Verde e as Subprefeituras, “cada uma com a sua lógica e dinâmica de funcionamento.”

Ela acredita na formação como o ponto de partida para elevar o nível técnico dos gestores públicos. Tatiana também elencou aquilo que considera mínimo para que um conselho funcione de maneira saudável.

1)      Transparência, divulgação e organização do pleito para a escolha dos representantes;

2)       Infraestrutura, sala de reunião, equipamento e funcionários da Subprefeitura que se dediquem ao conselho;

3)      Rotina, criação de grupos de trabalho, pautas em que todos podem participar, tempo de reunião, rendimento interno, controle das faltas.

“Devemos pensar os conselhos como uma grande escola com potencial para se construir a plataforma da Cidade Educadora”, conclui Tatiana.

Como tornar efetiva a participação social é uma questão complexa. Ainda existe enorme distância entre os processos decisórios e o cidadão comum no Brasil.
“A partir da greve dos queixadas, aprendemos que precisávamos pensar juntos em uma proposta para a nossa comunidade.” (Reprodução)

Perus

Para Mariana Belmont, jornalista, articuladora e moradora do bairro de Colônia, na zona sul de São Paulo, o conselho participativo local até funciona, mas as decisões vêm de cima. “A Subprefeitura está totalmente desconectada dos bairros que administra.”

Representando o Movimento pela Reapropriação da Fábrica de Cimento de Perus, Regina Bortotto enfatiza que a mobilização nasceu de uma necessidade de se perpetuar a cultura e memória local. “Tudo que temos é a partir de muita luta. A partir da greve dos queixadas, aprendemos que precisávamos pensar juntos em uma proposta para a nossa comunidade.”

Com secretarias que não conversam entre si e uma gestão municipal dividida, “como vamos melhorar a qualidade de vida?”, questiona Regina. “Participar amplia horizontes, e a educação passa a ser um alargamento desse horizonte. A cidade educa sem paredes nem regras, o conhecimento esta no planeta, ocupar aquilo que é público qualifica o lugar.”

(A foto que abre esta reportagem é de autoria de upslon)

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